AYAHUASCA NO TRATAMENTO DA DIABETES

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Em busca de novos e melhores tratamentos para a diabetes, um problema metabólico que afeta quase 400 milhões de pessoas no mundo, pesquisadores do Mount Sinai Hospital em Nova Iorque fizeram triagem de mais de 100 mil moléculas (2300 moléculas de uma biblioteca do FDA e 100 mil de fontes comerciais). Num primeiro estágio, identificaram 4500 compostos de potencial interesse. Numa segunda etapa, sobraram apenas 86 (0,08% do catálogo inicial). Estas 86 moléculas foram então testadas em linhagens celulares importantes no estudo celular da diabetes. E uma, apenas uma, se destacou como capaz de induzir reprodução das células pancreáticas produtoras de insulina: aharmina. Esta molécula recebe este nome pois foi primeiramente encontrada nas sementes da planta Peganum harmala, ou arruda da síria. E a harmina é também a principal molécula com efeitos farmacológicos no Banisteriopsis caapi, também conhecido como “cipó das almas”, ou ayahuasca como nomeado em Quechua.
O resultado, de extrema relevância médica, foi publicado na prestigiosíssima Nature Medicine dia 09 de março de 2015. Numa era de ciência altamente tecnológica, é exatamente o que revistas científicas de prestígio buscam: estudos tecnológicos capazes de indentificar compostos “puros” (leia-se moléculas isoladas de seus meios naturais) com potenciais medicinais relevantes. Mais do que isso, o artigo vai além e indica a ação da harmina na enzima DYRK1A como o possível mecanismo de ação de interesse, isto é, a indução de reprodução de células beta, potencialmente abrindo novos caminhos no tratamento da diabetes. Atualmente a diabetes é medicada com doses de insulina sintética, em muitos casos requerendo injeções diárias por toda a vida. A idéia seria então usar a harmina para induzir a recuperação pancreática e portanto estimular a produção de insulina endógena, potencialmente livrando milhões de pessoas das injeções diárias de insulina por toda a vida.
Mas na era do princípio ativo isolado e da medicina tecnológica, não aparecem no artigo a arruda da síria nem o cipó das almas. Apesar de ambas serem utilizadas medicinalmente há séculos, quiçá milênios. Isto torna a história ainda mais interessante. Porque além da descoberta extremamente relevante e bem vinda, o artigo revela, através do que não está lá, o raciocínio e abordagem das ciências médicas que perdura neste início de século: só a tecnologia salva.
Será?
O uso ritual e medicinal da ayahuasca, tema de livro recente, com frequência é realizado sob a prescrição de dietas específicas. E uma das recomendações mais comuns em diferentes contextos e culturas é a abstinência de açúcar, sabidamente o ingrediente mais problemático para os diabéticos (mas problemático não só pra eles). Arrogantemente vistas como crenças sem fundamento, estas recomendações e prescrições da medicina tradicional vez ou outra ressurgem e são “validadas” pela investigação científica. Isso remete a outras descobertas recentes sobre os efeitos da ayahuasca no metabolismo humano e a coloca como potencial medicina para diversas desordens metabólicas e energéticas, como por exemplo o câncer. Importante destacar que, molecularmente falando, estes possíveis efeitos metabólicos da ayahuasca não dependem da famosa DMT, psicodélico encontrado em plantas usadas como aditivos à ayahuasca, como a Psychotria viridis (chacrona, rainha) ou aDiplopterys cabrerana (chagropanga). Ou seja, enquanto a ciência psicodélica foca na DMT, diversos potenciais medicinais da ayahuasca podem ser únicos dentre os psicodélicos, dada a associação peculiar de plantas distintas em uma mesma bebida, combinando diferentes propriedades farmacológicas que ainda carecem de muita, mas muita pesquisa mesmo.
Mas antes de nos engajarmos nestas excitantes vias de investigação que certamente incluirão boas doses de alta tecnologia ocidental, vale a pausa pra refletir sobre as tecnologias do sagrado: qual o valor dos conceitos e práticas tradicionais na medicina amazônica, e como elas podem ser conciliadas com a medicina alopática moderna? Há algo que a medicina xamânica tenha a ensinar à medicina tecnológico-científica, e vice versa? Os frutos desta interação podem ser verdadeiramente revolucionários, e esse assunto é explorado em nosso documentário Medicina, atualmente em produção
fonte: http://plantandoconsciencia.org/



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